Foi nesse planeta que os primeiros hominídeos do Gênero Homo surgiram há pouco mais de dois milhões de anos. Mas foi nos últimos 200.000 anos que os humanos modernos caminharam pela Terra, explica Michel Mann em seu livro "Our Fragile Moment: How Lessons from Earth's Past Can Help Us Survive the Climate Crisis". Há uma ironia, ele afirma, as civilizações humanas existem apenas há cerca de 6.000 anos, ou seja, 0,0001% da história da Terra. Esse momento benevolente e frágil é dado pela mesma coisa que agora nos ameaça, a mudança climática.
Entretanto, pode ter sido a falta de parceria com Ciências Humanas e Sociais que permitiu um avanço tecnológico no setor produtivista focado na indústria e no uso desproporcional dos recursos naturais finitos do planeta, principalmente, nas questões de formação das cidades, matriz energética, alimentos, moradias e dispositivos eletrônicos com matéria-prima retirada por mineração predatória, trabalho escravo infantil e adulto. Além disso, há consumo exagerado de objetos desnecessários à sobrevivência, que foram (e são) inseridos na sociedade apenas como símbolos de status quo e/ou por interesse de parcerias obscuras. Contudo, o exagero do consumo baseado mais nos desejos humanos do que nas necessidades implica diretamente que temos falhas e corrigi-las não é uma preocupação generalizada.
Seria desejável que nos últimos 5 séculos uma parcela maior da sociedade tivesse ocupado mais espaço na construção das ciências. Isso certamente teria enriquecido a Ciência do Sistema Terra com melhores estratégias para não evoluir como evolui a crise climática. Essa evolução problemática foi acelerada pelos acúmulos de falhas e ganâncias nas gestões sucessivas educacionais, religiosas, governamentais, industrial e empresarial. A maioria dependente de exploração de humanos, solos, rios, mares, florestas e animais. Nossos defeitos são incompatíveis em relação ao ambiente em que vivemos. Como contornar essas falhas? Não sabemos. Em nosso país temos um bom diagnóstico dos fenômenos naturais adversos que causam calamidades, mas pouca ação mitigatória e quase nenhuma no combate de vulnerabilidades em espaços urbanos ou outras adaptações. Explica Taleb que somos pensadores, porém, conselhos, normas ou leis não são suficientes porque parecem assumir apenas como um guia do nosso aparato cognitivo para exercer um certo controle sobre nossas ações, mas não atingem por igual os sistemas emocionais das pessoas nas várias camadas socioculturais.
O preço pago pelos seres vivos da separação entre o metabolismo social e o metabolismo ecológico é alto. Por isso seria desejável mudar de rumo uma civilização que foi construída através de uma prática deliberada para desagregar o Social da Natureza, e depois tentar dominá-la. Ilusão Coletiva? Isto pode ter incentivado vertentes políticas baseadas em utopias em contraponto ao mundo distópico em que vivemos, que pode prejudicar a certeza intelectual. Contudo, mesmo que os cientistas apontem evidências de que somos frutos da Natureza, ainda não entendemos o seu funcionamento. Nós que achamos que compreendemos mais do que realmente compreendemos. Continua explicando Taleb que a realidade é confusa, não probabilística, aleatória e com muitas incertezas. Além disso, a Natureza gera eventos raros, imprevisíveis, fora do âmbito das expectativas comuns e com impacto extremo que pode causar morte em grande escala.
A forma de cultura em que operamos parece enraizada em uma relação indevida entre o controle humano e o controle das forças da Natureza. Segundo Bruno Latour, no ano de 1999, disse que até poderíamos questionar se existe capacidade da Ecologia Política em dar conta do desafio desta relação desagregada. É como a junção de palavras, Física e Ambiental, Ética e Ecológica e Geografia e Ambiental, elas agregam conceitos para representar o enfoque, mas não agregam pessoas para enfrentar o problema das agressões sistemáticas das quais nosso planeta sofre, inclusive, algumas vezes, até desagregam pesquisadores em seus institutos acadêmicos. Ainda explica Latour que, não saberemos jamais se as previsões apocalípticas com as quais os ativistas ambientais nos ameaçam ocultam o poder dos cientistas sobre os políticos, ou a dominação dos políticos sobre os cientistas. Tudo se passa como um duelo sem fim, ou com um possível fim dramático e conhecido, que são as implacáveis migrações humanas pelos continentes, que a História Natural nos mostrou ao longo dos anos, para reorganizar a maneira de se espalharem pelo mundo. De fato, todos nós somos (e seremos sempre) refugiados climáticos e/ou refugiados de guerra entre clãs poderosos que querem dominar o relevo de um território. Isso parece padrão. Entretanto, ninguém pode afirmar com certo grau de confiabilidade que um determinado evento em grande escala é mais provável do que outro. É possível afirmar, apenas, com um pouco mais de confiança, que um setor ou outro da sociedade é mais frágil do que outro se determinado evento ocorrer. São as questões explicadas do Cisne Negro e do Antifrágil de Nassim Taleb.
Contudo, é observado que os "Big Data" desenvolvidos após o ataque das torres gêmeas, em 11 de setembro de 2001, podem não dar conta preditiva desses eventos raros por causa da carga de incerteza que eles carregam, mesmo com a captação de informações digitais comportamentais de pessoas em redes sociais, ou em aparelhos eletrônicos domésticos inteligentes, que são realizados apenas por empresas e governos para o capitalismo de vigilância, não para o socorro dos mais desfavorecidos nos momentos de crise. Por exemplo, pandemia e crise climática, que parecem partes de um só processo, provaram que a relação de controle do Humano sobre a Natureza é falsa, por isso temos que tomar vacinas para se proteger de ataques de vírus, parasitas, fungos e de suas estratégias ambientais. Assim, poderia ser importante que trabalhos e investimentos em mitigações e adaptações de cidades, como alertam os especialistas em socioclimatologia, por exemplo, explica Monbiot, que só a sobrevivência interessará num planeta devastado e sem perspectivas de correções, mitigações e adaptações, inclusive, se chegarmos neste ponto, não será um momento oportuno para adaptações, pois neste estágio correremos o risco de psicopatas assumirem gestões governamentais.
Dessa forma, seria viável que as ciências com enfoque Ambiental se aproximassem de soluções preventivas e adaptacionais socioecológicas. Isto poderia contribuir imediatamente para minimizar o sofrimento de pessoas que moram em locais frágeis frente à crise climática, onde sua casa e sua saúde já estão comprometidas por mudanças no relevo. Cresce o número de pessoas nesta situação. O aumento contínuo da temperatura traz eventos extremos do clima e a interrupção de serviços da rede de materiais de distribuição de alimento, serviços médicos e energia. Possivelmente, a modelagem de ecossistemas pelos profissionais das ciências ambientais poderia atender imediatamente o planejamento territorial de locais em que as pessoas são mais vulneráveis e desfavorecidas socioeconomicamente. Pois são elas que sofrerão, de forma mais aguda e imediata, com as calamidades extremas. Por outro lado, para não segregar humanos de outras espécies vivas que compartilhem ecossistemas, uma solidariedade geopolítica seria necessária para cuidar do solo planetário habitável. As pesquisas deveriam contribuir para melhorar as condições sanitárias de assentamentos humanos, porque as que ocorrem na agropecuária para produção de alimentos no planeta também estão destruindo solos. Estamos sem saída? Isto poderia justificar tanto a promoção da justiça ambiental quanto do combate ao racismo climático, pois ambos ativismos necessitam ser fortalecidos com a apreensão da realidade social incerta que devemos "mudar".
Novembro de 2023.